Casos Clínicos
Ft. Osteopata Marcel A. Andrade de Paula
ANAMNESE
Nome: V. S. Idade: 23 anos
Gênero: Masculino
Profissão: estudande, jogador universitário de basquete.
Queixa Principal: Dor no joelho direito há mais de dois meses, que piorou nas ultimas duas semanas.
HDA
No mês de agosto começou a sentir dores no joelho direito durante os treinamentos. Essas dores permaneciam por um ou 2 dias após os treinos. Porém, Nas ultimas duas semanas o nível da dor aumentou (EVA = 09) e se tornou constante, entretanto ainda conseguia treinar e jogar. No ultimo treino não conseguiu terminar os exercícios, porque a dor era incapacitante. Durante a consulta relatou dor para permanecer em pé e ainda dificuldade em atividades cotidianas básicas como dirigir.
HDP
Na infância teve Síndrome de Osgood-Schlatter no joelho direito.
Condutas Anteriores
Fez uso de AINH por 2 semanas antes de procurar tratamento.
AVALIAÇÃO
Avaliação Física
Ao exame físico o paciente demonstrou dor à palpação da tuberosidade tibial. Dor para permanecer de pé, que aliviava quando sentava. Dor para fazer agachamento, para flexionar e estender o joelho direito. Para todos os movimentos a dor era na tuberosidade tibial. Antes do tratamento o paciente foi fotografado fazendo agachamento até a amplitude que a dor iniciava (fig. 1). Durante o agachamento o paciente relatou dor com EVA = 9 no meio do movimento e fez maior descarga de peso na perna direita. Este teste foi adotado como parâmetro de evolução.
Avaliação Osteopática Estrutural
Observou-se uma fixação bilateral dos ilíacos formando uma torção, onde encontramos: uma disfunção em anterioridade do ilíaco direito com imbricação do braço maior e uma disfunção em posterioridade do ilíaco esquerdo com imbricação do braço menor.
As vértebras lombares L4 e L5 se apresentavam em rotação a esquerda por tração dos ligamentos ílio-lombares.
O sacro estava em posição relativa aos ilíacos com base unilateral posterior a direita.
As vértebras torácicas T5 a T8 mostravam disfunções bilaterais em flexão (fig. 3).
ESTRATÉGIA DE TRATAMENTOTendo em vista o exame osteopático estrutural pode-se observar a intima relação anatômica da disfunção ilíaca em anterioridade a direita por um espasmo do músculo reto femoral. O Músculo reto femoral se origina da espinha ilíaca ântero-inferior e se insere na tuberosidade tibial (local dos sintomas do paciente). A disfunção muscular provocada por espasmos compromete o bom recrutamento muscular durante os movimentos interferindo na coordenação, força, resistência, flexibilidade e em dissipar energia mecânica produzida pelas descargas de peso durante os movimentos, principalmente os mais impactantes (saltos e corridas em alta intensidade).
Portanto, um espasmo no músculo reto femoral poderá sobrecarregar a articulação do joelho durante atividades cotidianas e esportivas.
Paciente realizou apenas uma sessão no dia 05/10/2011 com duração de aproximadamente 60 minutos.
Técnicas utilizadas:
• Técnica de Thrust para correção dos ilíacos (anterior direito e posterior esquerdo).
• Técnica de músculo energia para torção ilíaca.
A fim de estudo da eficácia das técnicas não foram feitas técnicas de stretching muscular e técnicas neurais.
O objetivo do tratamento foi melhorar o funcionamento das articulações ilíacas desse modo aliviando as tensões mecânicas do reto femoral sobre o joelho sintomático e ainda diminuir o espasmo muscular.
RESULTADOS
AVALIAÇÃO OSTEOPÁTICA VISCERALCom tratamento estrutural ainda na sessão o paciente relatou melhora de 50{8ec6837f4d4c723f3ffbc53e0f9280463c3f97d684af52f5a27bd55996592354} no nível da dor EVA = 5, e ainda foi observado aumento da amplitude no teste funcional (agachamento) (Fig. 2).
Ainda na mesma sessão optou-se por fazer uma avaliação osteopática visceral em busca de alterações em outros sistemas que poderiam contribuir para formação das disfunções e sintomas. Os achados da avaliação segue abaixo:
• Ausculta geral: Oscilação anterior, alavanca longa;
• Ausculta local: convergência para região umbilical;
• Teste de Kinesiologia aplicada: positivo para intestino delgado;
• Anamnese: uma evacuação a cada dois dias no ultimo mês. Alimentação pobre em fibras.
CADEIA DISFUNCIONAL
Interação com sistema visceral
A partir dos achados clínicos da avaliação estrutural e visceral buscou-se elaborar uma hipótese explicativa para formação dos sintomas. Desse modo, foi possível encontrar os elementos anatômicos e metaméricos que sustentam a conexão entre o sistema visceral e o aparelho músculo-esquelético (fig. 3).
Elementos metaméricos
A inervação simpática do intestino delgado se origina dos segmentos medulares de T5 a T9 e atingem o plexo celíaco através dos troncos simpáticos e nervos esplânicos maiores.
Os intestinos são insensíveis para maioria dos estímulos dolorosos, incluindo corte e queimadura; contudo, ele é sensível à distensão, que é percebida como cãibras ou cólicas (K. l. MOORE, 2011).
Essa característica sensorial dos intestinos pode justificar porque um estiramento sobre raiz do mesentério por uma disfunção ilíaca provoca um reflexo patológico sentido como esclerótomos na região de T5 a T9.
Cadeia Disfuncional
Figura 3: diagrama esquemático da cadeia disfuncional, mostrando a interação viscero-somática na formação da doença.
Elementos anatômicos
Raiz do mesentério (fig. 4): é a origem do mesentério, tem aproximadamente 15 cm. Ela se estende da junção duodeno jejunal no lado esquerdo da vértebra L2 até a junção ileocólica e a articulação sacroilíaca direita. A raiz do mesentério cruza sucessivamente:
• Duodeno;
• Parte abdominal da aorta;
• Veia cava inferior;
• Ureter direito;
• Músculo psoas maior direito;
• Vasos testicular ou ovárico direitos (K. l. MOORE, 2011).
Uma hipótese explicativa para os achados compreendem alguns fatores: o fator mecânico que conecta a articulação sacroilíaca direita e o músculo psoas maior (envolvidos na disfunção do ilíaco em anterioridade) ao intestino. Nessa situação o músculo psoas se encontra estirado e a partir da sua ligação com a raiz mesentérica poderia interferir na mobilidade das alças intestinais. O mau funcionamento do intestino provocaria aferências aberrantes ao SNC desencadeando disfunções somáticas nos segmentos torácicos de T5 á T8 sentidos como esclerótomos.
O meio ambiente físico do paciente (treinamento de basquete) pode ser responsável por desencadear a disfunção ilíaca, uma vez que saltos com desacelerações unilaterais são constantes nesse esporte.
Essa cadeia disfuncional poderia ainda ser construída pelo caminho inverso adotando o intestino como fator primário das disfunções. Usando como justificativa para esse fato o meio ambiente nutricional com uma dieta pobre em fibras, determinante na perda da mobilidade dessa víscera.
Figura 4: Raiz do mesentério (L. Busquet, 2006).
TRATAMENTO FASCIAL
• Liberação e harmonização das alças intestinais com técnicas de mobilidade;
• Normalização da motilidade do intestino;
• Liberação da fáscia superficial do joelho direito.
RESULTADOS
Após tratamento fascial o paciente relatou melhora total dos sintomas para o teste de agachamento EVA = 0 (fig. 5). Não apresentou mais dores para permanecer em pé ou fazer movimentos ativos com a articulação do joelho (flexão e extensão).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASO paciente foi orientado a não treinar ou jogar basquete por uma semana. Aumentar a ingestão de líquidos para 2,5 L por dia. Modificar a dieta aumentando a ingestão de frutas, verduras e legumes.
Paciente retornou no dia 20/10/2011. Nessa sessão relatou que o ficou assintomático por uma semana. Porém, quando retornou os treinamentos de basquete sentiu dores após o treino EVA = 3. Na avaliação física o paciente apresentou dor para correr (10 m) EVA = 3. Dor a palpação da tuberosidade tibial. Apenas o ilíaco direito estava novamente com disfunção. Foi feita a correção do ilíaco e repetiu o tratamento fascial. No fim da sessão o paciente não relatou dores para correr ou na palpação da tuberosidade tibial.
O paciente foi orientado a procurar tratamento se os sintomas retornassem, porém não houve procura.
• MOORE KL, DALLEY AF. Anatomia Orientada para a Clínica. 6 ed.: Guanabara Koogan, 2011.
• BUSQUET, L. Las Cadenas Musculares (Tomo VI): la cadena visceral. 1 ed.: Paidotribo, 2006.