Influência do tratamento osteopático na dor e na mobilidade do ombro: relato de caso

Por: Maíra Sgobbi de Faria

Supervisor: Marcelo Zanirato, C.E.I. 

Introdução

A dor no ombro não traumática é uma condição musculoesquelética comum na população em geral, com um pico de prevalência de 30% em indivíduos de 55 a 64 anos. Os distúrbios no ombro estão em terceiro lugar entre as razões musculoesqueléticas nas consultas de cuidados primários, representando 14% dos atendimentos em geral. Caracteriza-se por dor localizada na região do músculo deltoide, articulação acromioclavicular, parte superior do músculo trapézio e nos músculos da escápula¹.

O complexo do ombro e o músculo diafragma têm uma relação clara através da inervação e da conexão do tecido miofascial². A inervação se dá por meio do nervo frênico, cujas raízes saem das vértebras cervicais C3-C5. A relação miofascial ocorre, principalmente, por meio do centro frênico e do músculo diafragma.

Há pouca pesquisa experimental sobre abordagens de tratamento osteopático para dor no ombro¹. Na revisão sistemática de Pieters, L., et al. e no ensaio clínico randomizado de Vinuesa-Montoya, S., et al, a terapia manual associada ao exercício, demonstra resultados positivos na redução da dor no ombro quando comparada apenas ao exercício3 ,4. Um ensaio controlado randomizado pragmático de Schwerla, F., et al. demonstraram que uma intervenção de cinco tratamentos osteopáticos no período de 8 semanas levaram a mudanças positivas estatisticamente significativas e clinicamente relevantes de dor e incapacidade em pacientes com dor no ombro¹.

Nesse sentido, devido à grande incidência de dor no ombro e aos benefícios que as técnicas osteopáticas podem proporcionar para essa condição, é importante verificar a influência do tratamento osteopático na dor no ombro.

Relato de caso clínico

O presente caso clínico que será apresentado foi desenvolvido durante o período de residência clínica I, na clínica-escola de osteopatia do IDOT na cidade de Presidente Prudente/SP.  

Apresentação da paciente

Paciente: sexo feminino, 53 anos e balconista.

Queixa primária: dor no ombro direito durante movimento de abdução.

Queixas secundárias: dor no punho.

Histórico médico: diverticulite, litotripsia, retirada de nódulo na mama.

Co-morbidades: diverticulite.

Intervenções passadas: fisioterapia convencional realizada em casa.

Avaliação

Testes de exclusão: teste de Dekleyn positivo, teste de Jackson e descompressão negativo.

Teste relacional funcional: Lift de pulmão direito e pulso radial com estimulação de cicatriz lateral no seio direito.

Teste referencial: manobra de Convergência Podal.

Exames laboratoriais: não disponíveis.

Exames de imagem: não disponíveis. 

Mensurações: questionário de qualidade de vida SF-36, Escala Visual Analógica (EVA) para avaliação da dor.

-Sistemas encontrados na avaliação

 Sistemas musculoesquelético, neural, postural e visceral (tabela 1).

Tabela 1: Parâmetros e sistemas envolvidos após avaliação e anamnese  

Sistemas musculoesquelético e neuralSistema posturalSistemas visceral e vascular
Queixa PrincipalX1
AnamneseX2X3
Teste ReferencialX4X4X5
Teste Relacional FuncionalX6X7X8

X1: dor na abdução do ombro; X2: dor apenas quando realiza o movimento, dor à palpação; X3: hemitórax direito não realiza elevação durante a inspiração; X4: manobra de convergência podal; X5: kinesiologia aplicada ao pulmão X6: anteriorização da cabeça umeral; X7: estimulação da cicatriz; X8: lift de pulmão direito.

-Planejamento 

Quadro 1: Planejamento dos atendimentos

1º Atendimentoanamnese, EVA, questionário SF-36, teste referencial, teste relacional funcional e mensurações.
2º Atendimentoabrir sistema musculoesquelético.
3º Atendimentochecar o sistema musculoesquelético e abrir o sistema visceral.
4º Atendimentochecar sistemas musculoesquelético e visceral, e abrir o sistema postural.
5º Atendimentochecar sistemas musculoesquelético, postural e visceral.
6º Atendimentochecar todos os sistemas abordados, reavaliar e aplicar o questionário SF-36.

-Tratamento

 Foram realizados 6 atendimentos na clínica-escola de Osteopatia – IDOT, com duração de 50 minutos de cada sessão.

-Intervenção 

Tabela 2: Descrição das intervenções realizadas nos 6 atendimentos

1º Atendimentoanamnese, aplicação do questionário SF-36 (qualidade de vida), aplicação da escala EVA (dor), teste referencial  (MCP), relacional funcional (lift de pulmão direito e anteriorização da cabeça umeral).
2º Atendimentoabertura dos envelopes de musculoesquelético e neural (ME). Liberação espontânea do plexo cervical, saturação neural do plexo cervical, n. frênico e n. acessório, glide cervical (C2/C3, C3/C4, C4/C5, C5/C6), inibição com aproximação de supraescapular, trapézio, deltoide, liberação do diafragma e centro fênico. Mobilização da cabeça umeral e técnica em neutro para a articulação glenoumeral. Final da sessão com reteste da ADM ativa de ombro.
3º Atendimentoverificação dos sistemas musculoesquelético e visceral, abertura do sistema postural. Menos dor nas atividades do trabalho. Saturação de n. axilar, n. supraespinhal e n. infraespinhal. Continuidade nas técnicas de inibição muscular. Mobilização do músculo deltoide. Saturação dos n. torácico longo e subclavicular. Trabalho na cicatriz da mama – cicatriz patológica. Saturação dos nn. torácico longo e subclavicular. 
4º Atendimentorelata não sentir dor, apenas sensação do membro “pesado”. Continuação do trabalho com a cicatriz da mama e técnicas musculares. Avaliação e tratamento dos ligamentos da cúpula pleural. Mobilização A-P da cabeça do úmero e técnica global para glenoumeral.
5º AtendimentoContinuação das técnicas anteriores. Técnica para mobilidade do pulmão. Saturação de n. infraespinhoso e n. dorsal da escápula. Inibição com aproximação de infraescapular, subescapular e peitoral menor.
6º AtendimentoInibição com a aproximação de infraescapular e subescapular. Mobilização global da escápula. Mobilização em baixa amplitude para cabeça do úmero em superioridade. Finalização do tratamento

-Resultados 

A seguir são apresentados os resultados relacionados aos desfechos avaliados. Em relação à percepção de dor referida pela paciente, podemos observar pelo gráfico 1, referente à Escala Visual Analógica de dor (EVA). 

Gráfico 1. Escala Visual Analógica (EVA) pré e pós-tratamento 

Para a qualidade de vida, mensurada por meio do questionário SF-36 (gráfico 2), observamos que houve aumento dos valores para todos os domínios avaliados, indicando que o tratamento possibilitou melhora na qualidade de vida da paciente.

Gráfico 2. Avaliação da qualidade de vida por meio do questionário SF-36 pré e pós-tratamento.  

A figura 1 demonstra a avaliação qualitativa do tratamento musculoesquelético e visceral, comparando o 1º e o 2º atendimento.

Figura 1. Amplitude de movimento de abdução de ombro (pós-tratamento), comparando os dois primeiros atendimentos.

A figura 2 demonstra a avaliação qualitativa do tratamento musculoesquelético e visceral (3º atendimento) comparado ao tratamento que incluiu o sistema postural (4º atendimento). 

 Figura 2. Comparação da ADM de abdução de ombro comparando a 2ª sessão com a 3ª e 4ª sessões, onde foram incluídos o tratamento da cicatriz da mama.

A figura 3 demonstra a avaliação qualitativa do movimento comparando o 5º e o 6º atendimento, onde na 5ª sessão a paciente relatava apenas a sensação de cansaço no braço.

Figura 3. Comparação da ADM de abdução de ombro comparando o 5º com o 6º atendimento

Para a avaliação da dor, mensurada através da Escala Visual Analógica (gráfico 1), observamos redução gradual da dor, até a ausência de dor na última sessão.

Gráfico 2. Avaliação do nível de dor por meio da escala EVA pré e pós-tratamento.

-Conclusão

O tratamento osteopático em paciente com dor e diminuição da mobilidade do ombro associada a tensões relacionadas ao pulmão foi capaz de produzir efeitos positivos na melhora dos níveis de dor, qualidade de vida e amplitude de movimento de ombro.  Esses resultados demonstram a importância da avaliação dos sistemas corporais como um todo e que técnicas locais sobre o sistema visceral podem ser uma alternativa importante no tratamento do ombro, auxiliando o processo de autocura e homeostasia do corpo.

-Referências Bibliográficas

1- Schwerla F, Hinse T, Klosterkamp M, Schmitt T, Rütz M, Resch KL. Osteopathic treatment of patients with shoulder pain. A pragmatic randomized controlled trial. J Bodyw Mov Ther. 2020 Jul;24(3):21-28. doi: 10.1016/j.jbmt.2020.02.009. Epub 2020 Feb 22. PMID: 32825990.

2- Fernández-López I, Peña-Otero D, Atín-Arratibel MLÁ, Eguillor-Mutiloa M, Bravo-Llatas C, Genovés-Crespo M, Callejas-González FJ. Effects of diaphragm muscle treatment in shoulder pain and mobility in subjects with rotator cuff injuries: A dataset derived from a pilot clinical trial. Data Brief. 2021 Feb 12;35:106867. doi: 10.1016/j.dib.2021.106867. PMID: 33665260; PMCID: PMC7905368.

3- Pieters L, Lewis J, Kuppens K, Jochems J, Bruijstens T, Joossens L, Struyf F. An Update of Systematic Reviews Examining the Effectiveness of Conservative Physical Therapy Interventions for Subacromial Shoulder Pain. J Orthop Sports Phys Ther. 2020 Mar;50(3):131-141. doi: 10.2519/jospt.2020.8498. Epub 2019 Nov 15. PMID: 31726927.

4- Vinuesa-Montoya S, Aguilar-Ferrándiz ME, Matarán-Peñarrocha GA, Fernández-Sánchez M, Fernández-Espinar EM, Castro-Sánchez AM. A Preliminary Randomized Clinical Trial on the Effect of Cervicothoracic Manipulation Plus Supervised Exercises vs a Home Exercise Program for the Treatment of Shoulder Impingement. J Chiropr Med. 2017 Jun;16(2):85-93. doi: 10.1016/j.jcm.2016.10.002. Epub 2016 Nov 24. PMID: 28559748; PMCID: PMC5440641.

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